terça-feira, 8 de setembro de 2009

«IMPÉRIO»


Paquete português, propriedade da Companhia Colonial de Navegação, que o mandou construir aos estaleiros escoceses de John Brown, em Clydebank (Glásgua). Foi lançado à água em 1948 e registado na Capitania do Porto de Lisboa a 16 de Junho desse mesmo ano. Destinado à carreira de África, o «Império» -que tinha 164 tripulantes- podia receber 799 passageiros, distribuidos por cinco classes distintas : luxo, 1ª, 2ª, 3ª e 3ª suplementar. O navio deslocava mais de 13 000 toneladas em plena carga e media 161,78 m de comprimento por 20,83 m de boca. O seu calado superava os 8,50 m. O sistema propulsor do «Império» era composto por 2 grupos de turbinas e por 2 caldeiras, que permitiam ao paquete navegar à velocidade máxima de 19 nós. Transportou muitos milhares de soldados portugueses para África, depois da eclosão das guerras coloniais. Foi desactivado em 1974 e dele não haveria história para contar se, durante uma dessas viagens com tropas, o navio não tivesse sido o protagonista de um incidente, que podia ter tido consequências trágicas. Com efeito, em 9 de Janeiro de 1970, quando o paquete se dirigia para Angola e Moçambique, com a sua sempre excessiva lotação de militares, as máquinas pararam, deixando o «Império» à deriva e a meter água. A preocupação começou a manifestar-se entre os soldados (que, na sua esmagadora maioria, nunca haviam utilizado tal meio de transporte), pelo facto de ter faltado a energia eléctrica e, também, por não receberem informaçõesa dignas de fé sobre o que realmente se passava a bordo. O paquete derivou, em pleno oceano Atlântico, durante 6 longos dias; até que começou a beneficiar da assistência de alguns navios de bandeira portuguesa e recebeu a oportuna visita de um rebocador de alto mar, que o conduziu em segurança até ao porto do Mindelo (Cabo Verde), distante de 400 milhas náuticas. No relato do acontecimento que um militar, passageiro do «Império», fez (anos depois do incidente) a um jornal de Lisboa, os soldados tiveram, nesse período de 6 dias, sérios problemas para se alimentarem, já que as reservas de carne e outros géneros perecíveis tiveram que ser lançados ao mar, por terem apodrecido nas câmaras frigoríficas do navio. Soube-se mais tarde, que os problemas do paquete tiveram origem num rombo que se lhe abriu no casco, por baixo da casa das máquinas e que provocou uma inundação na dita. Rombo ocasionado por uma bomba, armadilhada por gente não identificada, quando o navio ainda se encontrava no porto de Lisboa. Só devido à fraca potência desse engenho explosivo é que o incidente relatado não redundou em catástrofe.

2 comentários:

  1. Olá a todos. Chamo-me Alexandre Batista e viajei no Império. Embarcado a 5 de Janeiro de 1970, pertencente ao BART 2901, CART 2648. Muita documentação refere que o rombo foi provocado por explosivo. A casa das máquinas situava-se por baixo do meu camarote e ouvimos em simultâneo a explosão, sentimos a redução da rotação da hélice e a inclinação do navio para bombordo. O rombo foi tapado com um encerado para não ser visto por outros navios que passassem. Estávamos à deriva e passou um navio Soviético. De imediato recebemos ordens para recolhermos aos camarotes e porões até ordem contrária. A vida a bordo foi difícil por razões alimentares e sanitárias. As reservas eram escassas e resumiam-se a bolachas e alguma fruta. Construíram-se latrinas em madeira na proa e na popa assistidas por um balde com o qual recolhíamos água do mar a fim de manter o mínimo de higiene. Objectivo conseguido. Imediatamente antes de se iniciar o reboque para Cabo Verde o Comandante convocou uma reunião com todos os oficiais e comunicou-lhes que "dentro de momentos saberemos se o navio aguenta o esforço que lhe vais ser exigido". Este receio do Comandante prendia-se com o facto de a casa das máquinas estar inundada com cerca de 80.000 toneladas de água e no momento da tensão dos cabos 0 desequilíbrio de peso podia partir o navio. À chegada a Cabo Verde foi-nos distribuído um balde com água para uma secção de combate, 8 a 10 homens e a fome encolheu-nos os estômagos. Desembarcamos em Mocímboa da Praia 43 dias após embarcar em Lisboa. O meu Batalhão teve como destino final Cabo Delgado o Paraíso das Minas. A CCS estacionou em Nangololo a minha em Muidumbe, a 2646 em Miteda e a 2647 em Antadora. Eis o Planalto dos Macondes. O Centro Operacional era Mueda. Foram 14 meses muito difíceis especialmente quando Kaúlza determinou que a guerra terminaria após a operação Nó Górdio. Puro engano. Durante esta operação morreram 132 homens, muitos com a comissão finda e com embarque marcado e data de chegada comunicada às famílias. No entanto foram para o Cabo Delgado. A Frelimo estendeu a sua acção para o Sul e reforçou em Tete e não abrandou no Cabo Delgado. Em fins de 1973 já causava estragos na Beira e Manica.Enquanto permaneci em Muidumbe deflagrámos cerca de 180 minas. Só em 6 de Maio de 1970 e num trajecto de 2,5 quilómetros detectámos e fizemos rebentar 46 engenhos. Um êxito sem acidentes quando antes já tínhamos sofrido três feridos graves em desminagens e protecção às colunas de reabastecimento que de Mueda num trajecto de 63 quilómetros na época das chuvas chegava a demorar uma semana. Até deixarmos Muidumbe a minha Companhia sofreu mais dois mortos em minas. No total perdemos 5 companheiros e cinco feridos graves.
    Finalizo voltando ao navio Império.Fintei-o porque regressei de avião. Fiquei impossibilitado de voltar a ver tubarões, peixes voadores e o magnífico peixe lua. Sou filho e neto de pescadores, não sei pescar mas sei comer quase tudo o que tem escamas. Há alguns meses comecei a escrever as memórias da Guerra e devo ter os meus "Retalhos da Memória" prontos no fim deste ano. Um Braço para todos os que lerem estas quase breves frases.

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  2. Olá a todos. Chamo-me Alexandre Batista e viajei no Império. Embarcado a 5 de Janeiro de 1970, pertencente ao BART 2901, CART 2648. Muita documentação refere que o rombo foi provocado por explosivo. A casa das máquinas situava-se por baixo do meu camarote e ouvimos em simultâneo a explosão, sentimos a redução da rotação da hélice e a inclinação do navio para bombordo. O rombo foi tapado com um encerado para não ser visto por outros navios que passassem. Estávamos à deriva e passou um navio Soviético. De imediato recebemos ordens para recolhermos aos camarotes e porões até ordem contrária. A vida a bordo foi difícil por razões alimentares e sanitárias. As reservas eram escassas e resumiam-se a bolachas e alguma fruta. Construíram-se latrinas em madeira na proa e na popa assistidas por um balde com o qual recolhíamos água do mar a fim de manter o mínimo de higiene. Objectivo conseguido. Imediatamente antes de se iniciar o reboque para Cabo Verde o Comandante convocou uma reunião com todos os oficiais e comunicou-lhes que "dentro de momentos saberemos se o navio aguenta o esforço que lhe vais ser exigido". Este receio do Comandante prendia-se com o facto de a casa das máquinas estar inundada com cerca de 80.000 toneladas de água e no momento da tensão dos cabos 0 desequilíbrio de peso podia partir o navio. À chegada a Cabo Verde foi-nos distribuído um balde com água para uma secção de combate, 8 a 10 homens e a fome encolheu-nos os estômagos. Desembarcamos em Mocímboa da Praia 43 dias após embarcar em Lisboa. O meu Batalhão teve como destino final Cabo Delgado o Paraíso das Minas. A CCS estacionou em Nangololo a minha em Muidumbe, a 2646 em Miteda e a 2647 em Antadora. Eis o Planalto dos Macondes. O Centro Operacional era Mueda. Foram 14 meses muito difíceis especialmente quando Kaúlza determinou que a guerra terminaria após a operação Nó Górdio. Puro engano. Durante esta operação morreram 132 homens, muitos com a comissão finda e com embarque marcado e data de chegada comunicada às famílias. No entanto foram para o Cabo Delgado. A Frelimo estendeu a sua acção para o Sul e reforçou em Tete e não abrandou no Cabo Delgado. Em fins de 1973 já causava estragos na Beira e Manica.Enquanto permaneci em Muidumbe deflagrámos cerca de 180 minas. Só em 6 de Maio de 1970 e num trajecto de 2,5 quilómetros detectámos e fizemos rebentar 46 engenhos. Um êxito sem acidentes quando antes já tínhamos sofrido três feridos graves em desminagens e protecção às colunas de reabastecimento que de Mueda num trajecto de 63 quilómetros na época das chuvas chegava a demorar uma semana. Até deixarmos Muidumbe a minha Companhia sofreu mais dois mortos em minas. No total perdemos 5 companheiros e cinco feridos graves.
    Finalizo voltando ao navio Império.Fintei-o porque regressei de avião. Fiquei impossibilitado de voltar a ver tubarões, peixes voadores e o magnífico peixe lua. Sou filho e neto de pescadores, não sei pescar mas sei comer quase tudo o que tem escamas. Há alguns meses comecei a escrever as memórias da Guerra e devo ter os meus "Retalhos da Memória" prontos no fim deste ano. Um Braço para todos os que lerem estas quase breves frases.

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